Em 2016, o Brasil recebeu o certificado de eliminação da circulação do vírus do sarampo da Organização Pan-Americana de Saúde. No entanto, dois anos depois, o país registrou um surto da doença com mais de 10 mil casos confirmados e 12 mortes. Segundo os últimos dados do Ministério da Saúde, o estado mais afetado foi o Amazonas, no norte do país, com mais de 9 mil notificações.
E não foi só no Brasil. Segundo a Organização Mundial da Saúde, o sarampo registrou um aumento de 30% nos casos em todo o mundo. Os especialistas acreditam que isso se deve, principalmente, aos baixos índices de vacinação. “Existe um movimento antivacinasque, apesar de lento, está crescendo. Outros fatores que influenciam negativamente são as fake news e a falta de informação. Seguidamente, recebo mães questionando, por exemplo, a associação entre a vacina tríplice viral e o autismo. Não existe, até hoje, um estudo que comprove isso. E apesar de as doses conterem os chamados vírus vivos, não há chances da criança contrair a doença”, esclarece o pediatra, infectologista e secretário do Departamento de Imunizações da Sociedade de Pediatria de São Paulo (SP-SP), Daniel Jarovski.
O especialista explica que assim como o reaparecimento do sarampo, a preocupação em relação a poliomielite também aumenta. Para ele, as duas são as mais graves do grupo de doenças erradicadas no Brasil. “Até o momento, nenhum caso de poliomielite foi registrado, mas existe, sim, uma preocupação por conta dessa baixa nas imunizações”, afirma. Apesar de o Brasil não registrar casos há quase 30 anos, alguns países – como Paquistão, Nigéria e Afeganistão – ainda sofrem com a doença. Por isso, o sinal de alerta vai para os mais de trezentos municípios brasileiros onde a taxa de vacinação ficou bem abaixo do esperado.
Além do sarampo e da poliomielite, a vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Isabella Ballalai, lembra de outra doença antiga que está voltando: a difteria. “Ela vem preocupando. Não é uma doença erradicada. Apesar de poucos, já temos casos no norte e nordeste. Existe vacina para a difteria e por que ainda tem pessoas desprotegidas? Se alguém contaminado entra no país e encontra pessoas não vacinadas, podemos ter um novo surto”, alerta.
Como reverter os baixos índices de vacinação?
Os especialistas são categóricos. Para eles, a única forma de manter as doenças erradicadas em um país é mantendo os níveis de vacinação altos. Segundo o infectologista, é quase impossível imunizar 100% da população, mas o índice de 95% é extremamente satisfatório. “Existe um conceito de que esses 5% que não foram vacinados acabam sedo protegidos indiretamente porque toda a população em volta que já recebeu a vacina”, explica.
No entanto, em 2018, a vacinação infantil teve o menor índice de imunizados dos últimos 16 anos. Segundo o Ministério da Saúde, todas as vacinas ficaram abaixo da meta. “Um grupo consultivo de vacinas para a OMS identificou a falta de confiança como os principais motivos dessa relutância. Atualmente, previnem-se cerca de 2 a 3 milhões de mortes por ano. Outras 1,5 milhão de mortes poderiam ser evitadas se a cobertura global de vacinação tivesse maior alcance”, diz um comunicado no site da ONU Brasil.
Por nota, o Ministério da Saúde informou que o objetivo agora “é interromper a transmissão dos surtos que estão acontecendo, impedir que se estabeleça a transmissão sustentada e manter a sustentabilidade da eliminação do vírus do sarampo”. O último caso confirmado de sarampo no Brasil foi no dia 3 de dezembro. Se em três meses não surgir mais nenhum caso, o Brasil pode se considerar livre do surto de sarampo. “Precisamos ficar três meses sem caso novo, nosso prazo é fevereiro”, afirma Isabella.
O que garante proteção é a vacinação individual
A gerente de compras, Marina Neves, 37, levou um susto quando a filha, Anna, 2, ainda era recém-nascida. “Minha bebê, com 45 dias de vida, pegou coqueluche e ficou entre a vida e a morte por duas semanas na UTI. Só quem passa por uma tormenta terrível sabe a importância de se proteger dessas doenças”, afirma. Anna se recuperou bem, apesar do susto, mas a história poderia ter tido um final diferente, já que a doença pode até ser fatal, especialmente para recém-nascidos.
Segundo a mãe, na época, a filha ainda não tinha recebido a dose da vacina, que só é aplicada aos 60 dias de vida. Ela acredita que, provavelmente, Anna contraiu de um adulto não vacinado. A doença também tem apresentado uma incidência de novos surtos em todo mundo na última década.
O Ministério da Saúde informou que todas as 19 vacinas – para combater 20 doenças – são oferecidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) a pessoas de todas as faixas etárias. São disponibilizadas cerca de 300 milhões de doses ao ano. “As pessoas precisam saber, por exemplo, que o sarampo é uma doença altamente transmissível, de evolução rápida e extremamente perigosa para as crianças. Ela pode levar a morte ou causar sequelas neurológicas graves. A melhor e mais eficiente forma de prevenção é a vacina. Por isso, a principal recomendação para os pais ajudar a elevar as taxas de vacinação”, orienta o infectologista.
“Se a gente erradica e para de vacinar, as doenças voltam! Será que é preciso esperar o surgimento de novos casos para se vacinar? O brasileiro precisa perder essa cultura de que vacina é campanha, vacina é rotina. Todo mundo precisa se imunizar. Quer um exemplo? A febre amarela é uma doença grave, 4 em cada 10 pessoas que contraem acabam morrendo. Estamos esperando o que?“, provoca Isabella.
“Levanto a bandeira da necessidade de vacinar, acima de qualquer reação que possa dar na criança. Todas essas doenças poderiam ser evitadas se a vacina não fosse um tabu”, conclui Marina.
Fonte: Revista Crescer